sábado, 24 de outubro de 2009

CARTA DO CACIQUE SEATTLE

Datado de 1854, o texto à seguir é reprodução da resposta do Cacique Seattle, da tribo Suquamish, do Estado de Washington, que habitava na vasta região que é hoje fronteira entre Canadá e Estados Unidos, ao Presidente norte americano Francis Pierce, após o Governo dar à entender que pretendia comprar as terras ocupadas por aqueles índios. Um exemplo de silvícola, guerreiro, caboclo, considerado ´´atrasado`` pelos homens brancos.

Em suas palavras, o grito de desespero de um povo condenado à morte, e uma declaração de amor à Terra, além da sabedoria ancestral e o retrato da evolução espiritual de uma raça incompreendida e subjugada, dotada de sensibilidade e consciência ímpares.

No início do L.˙. L.˙., que principia com a criação do mundo, Deus declara a perfeição de Sua obra ao criar a Terra:

´´ À porção seca chamou Deus Terra e ao ajuntamento das águas, Mares. E viu Deus que isso era bom. E disse: Produza a terra relva, ervas que dêem semente e árvores frutíferas que dêem fruto segundo a sua espécie, cuja semente esteja nele, sobre a terra. E assim se fez. A terra, pois, produziu relva, ervas que davam semente segundo a sua espécie e árvores que davam fruto, cuja semente estava nele, conforme a sua espécie. E viu Deus que isso era bom `` (Gênesis 1:10-12).

Em inúmeros outros trechos do L.˙. L.˙. o meio ambiente e o homem estão inseridos em um só contexto. Jesus, por exemplo, fazia suas pregações ao ar livre, às margens dos rios, nas montanhas. No momento em que a crucificação se aproximava ele se retirou para orar no Monte das Oliveiras. Sempre há ali referência a um componente da natureza: flor, rio, mar, deserto, plantas, árvores, sol, animais, plantações : ou seja, a inter-relação ´´Deus – Meio Ambiente – Homem ``.

Harmonizando-se com essa verdade espiritual, o Cacique de referida tribo clama em seu texto para que a relação de ética, respeito e amor que seu povo mantinha com a Terra, também fosse percebida e colocada em prática pelos homens ditos civilizados.

Conta-se que Mahatma Gandhi, ao ser perguntando se depois da independência a Índia perseguiria o estilo de vida britânico, teria respondido:

´´...) a Grã Bretanha precisou de metade dos recursos do planeta para alcançar sua prosperidade; quantos planetas não seriam necessários para que um país como a Índia alcançasse o mesmo patamar ? ``.

Complementando, disse ainda : ´´ Há o suficiente no mundo para todas as necessidades humanas, não há o suficiente para a cobiça humana ``.

Bem antes dessa, a sabedoria e a visão do Cacique Seattle já indicava que os modelos de desenvolvimento precisavam e continuam necessitando de cirúrgica modificação, de vez que sua nocividade converge ao comprometimento da qualidade de vida, e da própria vida no Planeta. Após mais de um século e meio de seu surgimento, e diante das transformações provocadas na Terra pela danosa interferência do Homem, o desabafo do Cacique tem incrível atualidade, substanciando sutil filosofia de vida que transcende ao mero vaticínio.

´´ O ar é precioso para o homem vermelho, pois todas as coisas compartilham o mesmo sopro : o animal, a árvore, o homem, todos compartilham o mesmo sopro. Parece que o homem branco não sente o ar que respira . Como um homem agonizante há vários dias, é insensível ao seu próprio mau cheiro.

Portanto, vamos meditar sobre sua oferta de comprar nossa terra. Se nós decidirmos aceitá-la, imporei uma condição : o homem branco deve tratar os animais desta terra como seus irmãos.

O que é um homem sem os animais ? Se os animais se fossem, o homem morreria de uma grande solidão de espírito. Pois o que ocorre com os animais, em breve acontece com o homem. Há uma lição em tudo . Tudo está ligado.

Vocês devem ensinar às suas crianças que o solo à seus pés é a cinza de nossos avós. Para que respeitem a terra, digam que ela foi enriquecida com a vida de nosso povo. Ensinem às suas crianças o que ensinamos às nossas : que a terra é nossa mãe. Tudo o que acontecer à terra acontecerá também aos filhos da terra. Se os homens cospem no solo, estão cuspindo em si mesmos.

Disto nós sabemos : a terra não pertence ao homem; o homem é que pertence à terra. Disto sabemos : todas as coisas estão ligadas como o sangue que une uma família. Há uma ligação em tudo.

O que ocorre com a terra recairá sobre os filhos da terra. O homem não teceu a teia da vida : ele é simplesmente um de seus fios . Tudo o que fizermos ao tecido, fará o homem à si mesmo.

Mesmo o homem branco, cujo Deus caminha e fala com ele de amigo para amigo, não pode estar isento do destino comum. É possível que sejamos irmãos, apesar de tudo. Veremos. De uma coisa estamos certos ( e o homem branco poderá vir à descobrir um dia ) : Deus é um só, qualquer que seja o nome que lhe dêem. Vocês podem pensar que o possuem, como desejam possuir nossa terra; mas não é possível. Ele é o Deus do homem, e sua compaixão é igual para o homem branco e para o homem vermelho. A terra lhe é preciosa e feri-la é desprezar seu Criador. Os homens brancos também passarão; talvez mais cedo do que todas as outras tribos. Contaminem suas camas, e uma noite serão sufocados pelos próprios dejetos.

Mas quando de sua desaparição, vocês brilharão intensamente, iluminados pela força do Deus que os trouxe a esta terra e por alguma razão especial lhes deu o domínio sobre a terra e sobre o homem vermelho. Esse destino é um mistério para nós, pois não compreendemos que todos os búfalos sejam exterminados, os cavalos bravios sejam todos domados, os recantos secretos da floresta densa impregnados do cheiro de muitos homens, e a visão dos morros, obstruída por fios que falam. Onde está o arvoredo ? Desapareceu. Onde está a água ? Desapareceu. É o final da vida e o início da sobrevivência.

Como é que se pode comprar ou vender o céu, o calor da terra ? Essa idéia nos parece um pouco estranha. Se não possuímos o frescor do ar e o brilho da água, como é possível comprá-los ?

Cada pedaço de terra é sagrado para meu povo. Cada ramo brilhante de um pinheiro, cada punhado de areia das praias, a penumbra na floresta densa, cada clareira e inseto a zumbir são sagrados na memória e experiência do meu povo. A seiva que percorre o corpo das árvores carrega consigo as lembranças do homem vermelho ...

Essa água brilhante que escorre nos riachos e rios não é apenas água, mas o sangue de nossos antepassados. Se lhes vendermos a nossa terra, vocês devem lembrar-se de que ela é sagrada e devem ensinar às suas crianças que ela é sagrada e que cada reflexo nas águas límpidas dos lagos fala de acontecimentos e lembranças da vida do meu povo. O murmúrio das águas é a voz dos meus ancestrais.

Os rios são nossos irmãos, saciam nossa sede. Os rios carregam nossas canoas e alimentam nossas crianças. Se lhe vendermos nossa terra, vocês devem lembrar e ensinar para seus filhos que os rios são nossos irmãos e seus também. E, portanto, vocês devem dar aos rios a bondade que dedicariam a qualquer irmão.

Sabemos que um homem branco não compreende nossos costumes. Uma porção de terra, para ele, tem o mesmo significado que qualquer outra, pois é um forasteiro que vem à noite e extrai da terra tudo que necessita. A terra, para ele, não é sua irmã, mas sua inimiga, e, quando ele a conquista, extraindo dela o que deseja, prossegue seu caminho . Deixa para trás os túmulos de seus antepassados e não se incomoda. Rapta da terra aquilo que seria de seus filhos e não se importa ... Seu apetite devorará a terra, deixando somente um deserto.

Eu não sei ... nossos costumes são tão diferentes dos seus. A visão de suas cidades fere os olhos do homem vermelho. Talvez porque o homem vermelho sejam um selvagem e não compreenda.

Não há um lugar quieto nas cidades do homem branco. Nenhum lugar onde se pode ouvir o desabrochar de folhas na primavera ou o bater de asas de um inseto. Mas talvez seja porque eu sou selvagem e não compreendo.

O ruído parece somente insultar os ouvidos. E o que resta de um homem, se não pode ouvir o choro solitário de uma ave ou o debate dos sapos ao redor de uma lagoa, à noite ? Eu sou um homem vermelho e não compreendo. O índio prefere o suave murmúrio do vento encrespando a face do lago, e o próprio vento, limpo por uma chuva diurna ou perfumado pelos pinheiros.

Em breve ocupareis toda a terra, enquanto que o nosso povo está a recuar rapidamente como uma maré que nunca mais regressará. A noite do índio promete ser muito escura. ``

O Cacique Seattle acabou por ceder à proposta efetuada, pois sabia que seu povo não resistiria às armas de fogo caso optasse pelo confronto, tendo lutado até o fim, sem êxito, para o cumprimento das condições exigidas e prometidas, e jamais realizadas pelos governantes de sua nação.

O tráfego do Planeta rumo à deterioração será infletido no momento em que a humanidade despertar e assimilar a verdadeira condição do Homem : Irmão das Estrelas e das Árvores, Filho do Universo e da Terra.

Constantino Peres Quireza Filho
Aug.˙. e Res.˙. Loj.˙. Simb.˙. Morada do Sol 227
Araraquara - SP


Referências Bibliográficas :

CARTA DO CACIQUE SEATTLE - Texto de domínio público distribuído pela ONU ( PROGRAMA PARA O MEIO AMBIENTE )
BÍBLIA SAGRADA, Editora Paulinas, S. Paulo;
AS PALAVRAS DE GANDHI, Mohandas Karamchand Gandhi, Editora Record, Rio de Janeiro .

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Grato pelo seu comentário. Fraternalmente.